Estão abertas, até o dia 24 de setembro, as inscrições para o curso de aperfeiçoamento em Atenção à saúde no sistema prisional. A iniciativa é da Fiocruz Mato Grosso do Sul, e visa desenvolver competências para prevenção de doenças e agravos, promoção e assistência à saúde da população privada de liberdade. Oferecido na modalidade à distância, o curso é autoinstrucional e pode ser acessado a qualquer momento pelo aluno.
E há uma novidade: a certificação modular. Agora, a cada módulo concluído, o participante recebe um certificado de conclusão. E, conforme for avançando nos demais módulos, o certificado é atualizado com a carga-horária estudada. A coordenadora adjunta do Campus Virtual Fiocruz, Rosane Mendes, explica a mudança: "Esse método dá flexibilidade ao aluno, que pode optar por cursar todos os módulos ou somente aqueles que interessam no momento".
O novo curso estimula a análise crítica sobre os problemas assistenciais, éticos e de gestão vivenciados no sistema prisional, e também a reflexão sobre a organização dos sistemas locais de saúde no contexto do sistema prisional, com ênfase ao direito a saúde. Além disso, o conteúdo traz subsídios teórico-práticos, para que o participante seja capaz de promover a qualificação da atenção à saúde voltada as principais doenças e agravos nos estabelecimentos prisionais.
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“É fácil reconhecer mulheres fortes. Elas são as que se constroem umas com as outras”. A mensagem que recebeu de sua aluna Raquel Viana foi mencionada pela presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, durante a abertura do ano letivo na Fundação – que aconteceu no Dia Internacional da Mulher (8/3). Com o tema Olhares femininos no cárcere, a aula inaugural promoveu um diálogo entre o estudo Nascer nas prisões, que teve a pesquisadora Maria do Carmo Leal (da Escola Nacional de Saúde Pública - Ensp/Fiocruz) como uma das coordenadoras; e a exposição Ausência, projeto autoral da fotógrafa Nana Moraes, que retratou mulheres presas.
O evento – coordenado pela Vice-presidência de Educação, Informação e Comunicação (VPEIC/Fiocruz) – uniu professores, alunos e trabalhadores; ciência e arte; instituições públicas e a sociedade, provocando a reflexão sobre uma realidade social dura, complexa e injusta. O público lotou o auditório do Museu da Vida para assistir à aula que enfocou as condições de vida e de saúde da população encarcerada e também as relações das mulheres presas com seus filhos.
Políticas institucionais para fortalecer as políticas públicas
A presidente da Fiocruz comentou a importância do tema da aula inaugural para a área da saúde, destacando a importância da instituição no campo da educação e formação para o Sistema Único de Saúde (SUS). Nísia enfatizou a necessidade de construir agendas públicas. “Um projeto de país não pode descuidar da questão da equidade”, disse. Ela lembrou que a sociologia discute que “a prisão é um efeito dramático que expõe as vísceras da sociedade”.
Na ocasião, foram apresentadas iniciativas e ações no campo da educação na instituição. “Num momento de grande adversidade, como este que estamos passando, a preocupação da Fiocruz tem sido com a sustentação dos programas de pós-graduação e das atividades da instituição, no caminho de aprovar e também de avançar em políticas que de fato sejam efetivas e tenham impacto direto na sociedade”, afirmou Nísia.
Por sua vez, o vice-presidente de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz, Manoel Barral Netto, lembrou que, apesar de avanços nos últimos anos, muito ainda tem que ser feito pela igualdade de gênero - não só na instituição, mas em todo o país, destacando a importância da luta diária contra todas as formas de discriminação. “Precisamos criar mecanismos que nos permitam encontrar novas formas de reduzir as desigualdades”.
Com o objetivo de articular as ações das diversas unidades da Fiocruz e fazer com que atendam à sociedade, Barral apresentou iniciativas na área da educação na Fiocruz, como o lançamento de editais de incentivo e fortalecimento do Programa de Integração e Divulgação Científica, a criação da Medalha Virgínia Schall de Mérito Educacional e a reedição do Prêmio Oswaldo Cruz de Teses. Clique aqui para saber mais sobre os editais.
Luta, resistência e construção de um novo tempo histórico
Participaram da aula como convidados: o reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ), Roberto Leher; a presidente da Comissão da Mulher na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, Marielle Franco (PSOL) e o vereador do Rio, Reimont Luiz (PT). Ao falarem na abertura da cerimônia, todos destacaram o atual contexto histórico – marcado pelo acirramento político e diversas formas de intervenção e opressão social – e a necessidade de resistir para transformá-lo num novo tempo, mais inclusivo, igualitário e que represente o pleno exercício da democracia e da cidadania. Os convidados também destacaram o papel da Fundação e sua atuação em Manguinhos e na Maré, territórios marcados por desigualdades sociais, violência e violação de direitos humanos.
Marielle disse: “Esse é um lugar pelo qual tenho muito apreço, muito carinho. Estando como presidente da Comissão da Mulher, penso que esse é um tempo de uma nova reflexão histórica, de um novo tempo histórico. Mulheres encarceradas, mulheres que ficam nas filas das prisões... Essa busca por diretos é pautada pela busca pelos direitos das mulheres. Nesse sentido, o tema da aula inaugural fala sobre a busca desse novo tempo histórico pela luta dos direitos humanos, num 8 de março que é um março de luta, de celebração. Eu sou das feministas históricas que agradecem às vozes que ocupam o lugar da resistência, desse lugar onde as mulheres são vítimas de estupro, da violência e precisam sim pensar numa nova sociedade. Como dizia Rosa Luxemburgo: que as flores nasçam do asfalto”.
Uma instituição comprometida com a equidade
O representante da Associação de Pós-graduandos da Fiocruz (APG/Fiocruz), Jefferson Campos, falou sobre o processo formativo como lugar de inclusão. “Nossas pesquisas têm papel fundamental para garantir que as populações mais pobres tenham acesso ao tratamento indicado e a direitos. Nós, estudantes, precisamos ocupar novos espaços e levar adiante tais comprometimentos. Somente uma academia formada por olhares sociais diferentes poderá reconduzir o olhar sobre estas populações”, afirmou.
A voz das mulheres reverberou na mesa de abertura. A representante do Comitê Pró-Equidade de Gênero e Raça da Fiocruz, Maria Helena Barros, destacou a importância de ter, pela primeira vez em mais de um século uma mulher à frente da presidência da Fiocruz. “Precisamos agradecer a essas mulheres: a Maria do Carmo, que traz para dentro da academia pessoas que estão invisíveis, marginalizadas pela sociedade, e a Nana, que traz a leitura da arte e da poesia que existe dentro de toda mulher”, disse. Representando as trabalhadoras, a vice-presidente da Asfoc-SN, Mychele Alves, leu uma mensagem da Fiocruz Pernambuco, afirmando: “Mulheres vamos florescer na diversidade”.
Nascer nas prisões
Uma das coordenadoras do estudo Nascer nas prisões, a pesquisadora Maria do Carmo Leal apresentou os principais dados da pesquisa. Foi a primeira vez que um estudo traçou o perfil da população feminina encarcerada que vive com seus filhos em unidades prisionais das capitais do país, sendo possível conhecer as características e práticas relacionadas aos campos da atenção, gestação e parto durante a encarceramento. “O que a pesquisa mostrou é o sofrimento, a violação de direitos, entre outros pontos, que acabam atingindo não só essas mulheres, mas também seus filhos”, disse, destacando a grande vulnerabilidade destas mulheres. A pesquisa mostrou que 55% das mulheres tiveram menos consultas de pré-natal que o recomendado, 32% não foram testadas para sífilis e 4,6% das crianças nasceram com sífilis congênita. Foram ouvidas 241 mães e 200 grávidas: 45% com menos de 25 anos, 57% de cor parda, 53% com menos de oito anos de estudo e 83% com mais de um filho.
O trabalho da equipe que realizou o estudo ajudou a embasar a decisão inédita tomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em fevereiro, de conceder habeas corpus coletivo a mães e gestantes que estejam em prisão preventiva, aceitando o argumento de que "confinar mulheres grávidas em estabelecimentos prisionais precários, subtraindo-lhes o acesso a programas de saúde pré-natais, assistência regular no parto e pós-parto, e ainda privando as crianças de condições adequadas a seu desenvolvimento, constitui tratamento desumano, cruel e degradante".
Desamadas
Dor. Saudade. Perda. Violência. Abandono. Perdão. Estas foram as palavras que Nana Moraes, fotógrafa e autora da exposição Ausência, usou em sua obra para retratar o sofrimento de mulheres presas e a manutenção dos vínculos familiares após o encarceramento. A exposição, segunda parte da trilogia Desamadas, foi criada para dar voz e forma a mulheres ditas “invisíveis” pela sociedade. A trilogia teve início em 2011, com o lançamento do livro Andorinhas, que narrava histórias de prostitutas de estrada. “Todas elas me falavam: não sou bandida. O que eu faço não é crime. Percebi ali que, mais estigmatizadas que as prostitutas, eram as mulheres presas”, afirmou.
Surgia então o Projeto Travessia, que deu origem à exposição. Nana levaria até a família das detentas uma foto atual delas e uma carta, e traria de volta uma foto da família e uma resposta à carta. Mas, antes, precisava que os familiares dessas presas autorizassem a ação. Das 17 famílias contatadas, apenas seis deram o aval. O material deste “reencontro” serviu de bordado para peças que toda casa abriga: cobertor, toalha de mesa, cortina, tapete, toalha de banho, manta de sofá. “Essas famílias foram rasgadas e descosturadas. Por isso, uni os retalhos com fotos, cartas e algumas palavras que li com frequência nas mensagens”, contou a fotógrafa.
Ela percebeu que, diferentemente dos homens presos, que sempre recebem visitas, mulheres presas tendem a ser trocadas por seus companheiros e, ainda, rechaçadas pela família. “A maioria delas é chefe de família. Quando uma é presa, suas famílias são destruídas imediatamente. Essas mulheres são punidas duplamente - como mães e como criminosas”, contou Nana.
Olhares e vozes
O público participou da aula e o clima foi de emoção. Entre as falas, uma chamou a atenção: a de Rejane Barcelos. Mulher, negra, oriunda da comunidade e camelô, ela falou sobre o papel das instituições como a Fiocruz na redução das desigualdades sociais. “Acho importante chamar não só à reflexão, mas à ação, para não perpetuar esta situação das mulheres. Elas estão no presídio quando deveriam estar nas salas de aula, nos centros culturais. Não deveriam ser apenas objeto de pesquisa, mas terem condições para chegarem a ser pesquisadoras também. Do contrário, vamos continuar apenas produzindo estudos sobre mulheres da periferia em vez de transformar a realidade delas”, argumentou. Rejane falou também sobre racismo e escravidão. “Estas mulheres são chefes de família porque muitos homens negros também são presos e sofrem com o racismo da sociedade. Não temos acesso aos escritos libertários. Educadoras, profissionais da saúde e da cultura devem intervir nessa realidade para acabar com o isolamento de pessoas pretas, pobres e marginalizadas”, disse.
A presidente Nísia Trindade Lima encerrou a aula falando sobre a importância de refletir sobre as raízes da injustiça. “Esta aula mostra nossa indignação diante destes sofrimentos que são naturalizados. Precisamos somar vozes para combater a injustiça social que é, não só conjuntural, mas crônica”.
* Por Flávia Lobato (Campus Virtual Fiocruz) com informações de Leonardo Azevedo e Erika Farias (CCS/Fiocruz)
Este ano, a Fiocruz abrirá o ano letivo no Dia Internacional da Mulher (8/3), com o tema Olhares Femininos no Cárcere. As convidadas do evento são Maria do Carmo Leal - pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) e uma das coordenadoras do estudo Nascer nas prisões - e a fotógrafa Nana Moraes, autora da exposição Ausência, que retrata mulheres presas. Para que você tire o máximo de proveito desta discussão tão atual e importante no Brasil, o Campus Virtual Fiocruz fez uma seleção de quatro documentários sobre o tema que será debatido. Veja a lista e assista aos filmes:
Este minidocumentário de 2016 é a segunda parte de uma produção da Pastoral Carcerária. A primeira parte é intitulada A Tortura como Política de Estado e trata das novas roupagens da tortura dentro do sistema carcerário. Já a parte 2, As Mulheres e o Cárcere, aborda as torturas sofridas especificamente por mulheres presas. O material é um apelo contra as precariedades vividas pelas mulheres encarceradas e contra a tortura sistemática no sistema prisional. Como questão central, o filme traz a problemática da urgente e necessária redução na população carcerária.
O documentário retrata a vida de mulheres que foram presas por pequenos furtos, e de uma advogada que, voluntariamente, se propôs a defendê-las. Bagatela expõe fragilidades do sistema judiciário brasileiro e a relação tensa entre quem quer ajudar e quem precisa de ajuda. O filme é de 2010 e foi dirigido por Clara Ramos.
O documentário de Liliana Sulzbach, vencedor do prêmio de melhor documentário no Festival de Gramado de 2004, acompanha a vida de três mulheres que passaram pela Penitenciária Madre Pelletier. Cláudia, presidiária mais antiga e respeitada da Penitenciária Madre Pelletier, deve deixar o cárcere em breve, assim como Betânia, que vai para o regime semi-aberto. Ao contrário de Daniela, que recém chegou à prisão e aguarda julgamento. Enquanto Daniela busca proteção na cadeia, Cláudia e Betânia vão enfrentar as incertezas de quem volta para a rua.
Dirigido por Geysa Chaves, o documentário de 2010 consiste na história de cinco mulheres condenadas por envolvimento direto ou indireto nos crimes idealizados e executados por seus namorados, maridos e/ou companheiros. O filme revela o drama e os conflitos vividos por elas fora e dentro do cárcere - a penitenciária feminina Talavera Bruce.
Mais informações sobre a aula inaugural aqui.
Por Flávia Lobato e Raphaela Fernandes (Campus Virtual Fiocruz)
A Fiocruz abre o ano letivo de 2018 no Dia Internacional da Mulher (8/3), às 9h. Com o tema Olhares femininos no cárcere, a aula inaugural terá como convidadas a pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), Maria do Carmo Leal, uma das coordenadoras do estudo Nascer nas prisões; e a fotógrafa Nana Moraes, autora da exposição Ausência, que retratou mulheres presas.
O evento une ciência e arte, debatendo o direito à saúde e à vida. Serão apresentados dados estatísticos relacionados às condições de vida e de saúde da população feminina encarcerada, e comentados os sentimentos de quem vive e conheceu essa realidade. De acordo com o estudo, 31% das mulheres presas são chefes de família e 83% delas têm pelo menos um filho. Os dados da pesquisa contribuíram para a aprovação do habeas corpus coletivo que garantirá à mulheres grávidas e mães de crianças de até 12 anos que estejam em prisão provisória o direito de deixar a cadeia e ficar em prisão domiciliar até seu caso ser julgado.
Na programação também haverá a exibição de um vídeo sobre a exposição da fotógrafa Nana Moraes e a leitura dramatizada de cartas. O trabalho compõe uma trilogia autoral sobre a vida de mulheres estigmatizadas, observando suas relações com os filhos e familiares, através de fotos e cartas.
Na abertura do ano letivo, a Vice-presidência de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz também lançará vários editais.
Abertura do ano letivo Fiocruz 2018
Tema: Olhares femininos no cárcere
Palestrantes: Maria do Carmo Leal e Nana Moraes
Data e horário: 8/3, às 9h
Local: Auditório do Museu da Vida/Fiocruz (Avenida Brasil 4.365, Manguinhos, Rio de Janeiro - RJ)
O evento é aberto ao público e não é necessário se inscrever antes.
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Foto: Eduardo de Oliveira (Revista Radis)