Comunicação e ética são dois temas transversais que precisam aparecer em todos os níveis de educação da Fiocruz

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Publicação : 29 DE MARçO DE 2017

Autor(es) : Flávia Navarro da Silva Lobato

Comunicação e ética são dois temas transversais que precisam aparecer em todos os níveis de educação da Fiocruz Comunicação e ética são dois temas transversais que precisam aparecer em todos os níveis de educação da Fiocruz

Por Nathállia Gameiro (Ascom/Fiocruz Brasília)

O vice-presidente de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz, Manoel Barral-Neto, foi convidado para abrir o ano letivo da Escola Fiocruz de Governo. Nesta entrevista, ele fala sobre as prioridades da sua gestão, o papel da instituição na capacitação de profissionais de saúde e a importância da Política de Comunicação da Fiocruz. Leia à entrevista e assista ao vídeo.

Nathállia Gameiro (Fiocruz Brasília): Que balanço faz dos primeiros dias da gestão? Qual o principal desafio?
Os primeiros dias de gestão são de articulação da equipe, temos muitos planos em conjunto, a ideia é ter uma coerência das ações. O grande desafio é enfrentar a crise da saúde pública, principalmente no que diz respeito à emergência viral, considerando a escassez de recursos devido à crise econômica. É um desafio bastante importante fazer o máximo com poucos recursos. É nessa hora que a gente consegue demostrar eficiência e a capacidade da Fiocruz.

Nathállia Gameiro (Fiocruz Brasília): Quais são as prioridades da sua gestão à frente da Vice-presidência de Educação, Informação e Comunicação?
Manoel Barral: Em termos de educação, há duas prioridades: consolidar a integração do nível de pós-graduação stricto e lato sensu (especialização, mestrado e doutorado), e integrar o desenvolvimento dos programas de residência médica e multiprofissional nos institutos nacionais, principalmente, onde o perfil destas residências precisa ser melhor definido. O grande desafio é atender os demais segmentos no setor da saúde, pois, como órgão do Ministério da Saúde, a Fiocruz também tem a missão de educar no campo da saúde.

Um bom exemplo é a vigilância. No Brasil, há uma crise neste campo, que se deve, em grande parte, à capacitação de pessoal. Por isso, é preciso investir muito em vigilância. Quando se fala na capacitação dos profissionais desta área, os números são muito grandes, e há profissionais de diferentes perfis, locais e níveis de acesso à informação. Portanto, temos a enorme tarefa de organizar esta demanda para enfrentar este desafio. 

A Fiocruz já tem muitas ações nesse campo e é preciso realmente mapear, ver as áreas em que ainda é necessário esforço adicional, e aquelas em que devemos colaborar com outras instituições para alcançar os objetivos. A capacitação para o restante do setor saúde, não apenas do setor acadêmico do ponto de vista mais estrito, é o grande desafio — mas podemos citar muitos outros exemplos. Cabe também um programa de capacitação rigoroso para o Complexo Econômico da Saúde, para o sistema prisional brasileiro (a saúde das prisões não se restringe à população privada de liberdade, mas também a de suas famílias e aos profissionais que trabalham nas prisões). É um desafio enorme e, no momento, o nosso grande esforço é organizar esse tipo de capacitação.

Nathállia Gameiro (Fiocruz Brasília): Por favor, comente a importância da educação continuada.
Manoel Barral: Na verdade, se impõe essa discussão. Na graduação, a Fiocruz não tem um envolvimento direto. Estamos falando de capacitação de diversos níveis, inclusive de nível técnico, para muitas atividades que são importantes para o funcionamento do setor saúde. E, completada a primeira etapa dessa transformação, é necessário manter os indivíduos atualizados. O desafio é grande mas tem que ser enfrentado. Idealmente, esse tem que ser o nosso objetivo — uma educação permanente, uma educação presente. A educação deve ser estimuladora, atrair a atenção das pessoas, ir além de necessitar, incentivar que queiram também fazer. É bastante importante ter em mente que educação não é só capacitar uma vez, mas manter as pessoas atualizadas.

Nathállia Gameiro (Fiocruz Brasília): Como avalia a Escola Fiocruz de Governo e o que espera para os próximos anos?
Manoel Barral: Esta é a importância da Escola, no momento: o desafio de capacitar o pessoal do SUS [Sistema Único de Saúde], de capacitar do pessoal de saúde, que é nossa missão primária. E essa capacitação é o grande objetivo da Escola Fiocruz de Governo (EFG). Há dois modelos de escola de governo. O primeiro atua na capacitação dos funcionários, do pessoal do governo. O outro capacita o pessoal necessário ao desempenho de ações do governo. No caso da EFG, a interpretação que nós desejamos é a mais abrangente: que inclui não apenas o servidor público, mas todas as pessoas que trabalham no SUS e que precisam estar bem capacitadas para que o Sistema funcione adequadamente. É uma visão mais ampla, que vai além de capacitar o servidor. 

Desejamos que a Escola Fiocruz de Governo realmente assuma esse papel do grande agente de capacitação de pessoal para o SUS, mas não de forma isolada. Evidentemente, a Escola vai colaborar, integrar esforços de outras instituições, mas a Fiocruz e o Ministério da Saúde têm uma importância intrínseca. A EFG deve ter um papel destacado nessa capacitação. É claro que a gente não pretende ser a única escola de governo a fazer isso, porque seria uma tarefa enorme e precisamos de colaboração. Com certeza, a EFG vai interagir com muitas outras instâncias no campo da educação. Mas seu papel deve ser predominante na questão da observação para os outros seguimentos do campo da saúde, não só do acadêmico.

Nathállia Gameiro (Fiocruz Brasília): Como o ensino na Fiocruz se alinha às necessidades emergenciais do SUS (tais como as arboviroses, tendo em vista, por exemplo, a situação da zika)?
Manoel Barral: A Fiocruz Fiocruz já enfrentava esse desafio. Antes mesmo das emergências, o Brasil e a Fundação já estavam cuidando disso. A maior prova de que isso não nos pegou desprevenidos foi a resposta dada pela comunidade científica brasileira em saúde — nesse caso, ao problema da zika. O problema identificado foi o  envolvimento severo do sistema nervoso com os casos de microcefalia e outras manifestações. A ciência não havia descrito este problema como uma infecção decorrente da zika. Isso foi detectado  e descrito no Brasil e produziu-se uma quantidade importante de conhecimento o que ainda não é suficiente. É preciso continuar esse esforço, mas isso mostra que a Fiocruz e outras instituições brasileiras vêm preparando pessoal capaz de dar resposta às demandas de saúde pública. E olha que a gente está enfrentando uma crise que não tem precedentes, é uma infecção arboviral seguida de outras e algumas concomitantes. O sistema tem respondido a este imenso desafio. Evidentemente, é também um alerta: temos que fazer ainda mais, expandir esse esforço, começar a pensar o que é necessário no futuro para detectar o problema mais precocemente.

Nathállia Gameiro (Fiocruz Brasília): No caso das arboviroses, há alguma orientação aos professores que fazem parte do corpo docente da Fiocruz?
Manoel Barral:
O sistema de educação da Fiocruz tem uma boa comunicação entre os diversos setores, e a Câmara Técnica de Ensino é bastante ativa. Deveríamos chamá-la de Câmara Técnica de Educação, no sentido mais amplo, pois é basicamente uma representação de todos os responsáveis pela educação em cada unidade da Fiocruz. As mensagens e grandes decisões nesse campo são tomadas em conjunto na Câmara Técnica, como recomendação do Conselho Deliberativo. O Conselho sanciona ou sugere alterações, mas claramente o sistema funciona de forma muito integrada pela discussão e contribuição das diversas unidades.

Nathállia Gameiro (Fiocruz Brasília): O senhor assumiu a Vice-presidência de Educação, Informação e Comunicação, no momento em que a Fiocruz acaba de elaborar sua Política de Comunicação. Qual a importância da comunicação para uma instituição do porte da Fiocruz? E que diretrizes ou linhas pretende adotar para que a nossa Política seja de fato incorporada junto às unidades?
Manoel Barral: No campo da comunicação, o encaminhamento e a aprovação de uma Política pela Fiocruz é resultante de uma discussão das unidades, posteriormente proposta ao Conselho Deliberativo. A gente sempre tem a grande esperança de que essa política será incorporada e ativada pelas unidades porque não foi imposta, foi emanada de uma decisão coletiva.  É uma tarefa da Vice-presidência, em conjunto com as unidades, continuar esse esforço para estabelecer um cronograma de aplicação das medidas que efetivem a Política. Estamos trabalhando nisso e, na próxima reunião da Câmara, discutiremos etapas e progressos e, claramente, temos o grande objetivo de discutir a ciência aberta. A Fiocruz tem sua Política de Acesso Aberto ao Conhecimento e é necessário ampliá-la, cautelosamente. Mas precisamos chegar em uma discussão clara sobre dados abertos. Somos uma instituição pública de saúde e os nossos dados devem beneficiar a população o mais rapidamente possível: este é o nosso foco.

Além disso, temos o desafio da comunicação com a sociedade, uma tarefa que se impõe cada vez mais. A atividade de ciência no Brasil ainda é muito bem vista pela população. Na Europa, por exemplo, se a população não for muito bem informada sobre o que está passando em ciência de forma geral, começa a haver uma perda da confiança. Por se tratar de algo que a população nem sempre conhece, os riscos de se perder esse controle acabam, algumas vezes, criando uma insatisfação social. Isso aconteceu não muito longe, na questão, por exemplo, na reação contra as vacinas — quando, na verdade, vacinas são o método de proteção mais eficiente que a ciência já desenvolveu. Hoje, na formação dos cientistas da saúde, é necessário que o componente da comunicação com a sociedade esteja presente. Não podemos capacitar uma pessoa pensando que ele vai viver num laboratório fazendo exames, testes e desenvolvendo hipóteses sem que ele saiba se comunicar com as pessoas em volta. Esse componente deve ser melhor equacionado nos nossos cursos, não para substituir os comunicadores, mas é preciso que essa linguagem da comunicação e essa sensibilidade para a necessidade de comunicação esteja presente na formação, assim como as questões éticas. Então são dois temas transversais que precisam aparecer em todos os níveis de educação da Fiocruz.

Assista a entrevista em vídeo.

 

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