Hoje, a história sabe, ou admite, que as origens do Brasil são indígenas, e, apesar da invasão dos portugueses estar nos registros oficiais como "descoberta do país", nosso chão foi forjado por eles e, depois da colonização, em 1500, também pelo sangue dos negros, que foram trazidos como escravos ao Brasil. Após 524 anos da "descoberta do Brasil", o racismo, o preconceito e a discriminação racial em suas diversas formas e instâncias ainda são desafios no país que, segundo o Censo 2022 do IBGE, têm 45% de sua população parda.
O Sextas desta semana faz alusão ao Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro, com um trecho do samba-enredo “História para Ninar Gente Grande”. A música, que levou a Estação Primeira de Mangueira ao título de 2019, apresenta uma grande reinterpretação da história oficial brasileira apresentada nos livros e valoriza lideranças populares negligenciadas e questiona heróis oficiais.
Com versos que o livro apagou
Desde 1500
Tem mais invasão do que descobrimento
Tem sangue retinto pisado
Atrás do herói emoldurado
Mulheres, tamoios, mulatos
Eu quero um país que não está no retrato
Brasil, o teu nome é Dandara
E a tua cara é de cariri
Não veio do céu
Nem das mãos de Isabel
A liberdade é um dragão no mar de Aracati
Salve os caboclos de julho
Quem foi de aço nos anos de chumbo
Brasil, chegou a vez
De ouvir as Marias, Mahins, Marielles, malês
Este samba foi usado como texto de apoio na redação da maior prova educacional do Brasil, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), cujo tema de 2024 foi "Desafios para a valorização da herança africana no Brasil", articulando, assim, a história, a ancestralidade e a educação, promovendo o debate de temas relevantes entre os personagens mais capazes de mudar os rumos da história de nosso país, o jovens.
O samba-enredo “História para Ninar Gente Grande” é de autoria de Luiz Carlos Máximo, Silvio Moreira Filho, Danilo De Oliveira Firmino, Deivid Domenico Ferreira Lima, Manuela Trindade Oiticica, Marcio Antonio Salviano, Ronie De Oliveira Machado e Tomaz Disitzer Carvalho De Miranda.
Vale ressaltar ainda que em 2024 o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra tornou-se feriado nacional. Em sessão especial do Senado para comemorar a conquista, em 19/11/2024, o senador Paulo Paim, que foi relator do projeto de lei, afirmou que foi alta a expectativa pela nacionalização do feriado, por meio da Lei 14.759, de 2023. Ele lembrou que a data remete ao dia da morte de Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares, importante comunidade de resistência de escravizados durante o Brasil Colonial. Na ocasião da sessão, Paim apontou que seu desejo é que o feriado do dia 20 sirva para a sociedade refletir sobre como pode melhorar a vida de todos os brasileiros, especialmente dos mais vulneráveis. Segundo ele, garantir o exercício pleno da cidadania também é combater o racismo e a exclusão, reduzindo as desigualdades. Ele defendeu a manutenção de políticas inclusivas de educação, a exemplo da instituição das cotas nas universidades públicas e no serviço público, Previdência Social justa, emprego digno, salário decente, bem como a presença da história e do estudo da cultura afro-brasileira e indígena nas escolas brasileiras.
A vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco, homenageada com o samba da Mangueira de 2018, sofreu um atentado, junto com seu motorista Anderson Gomes, em 2018. O caso de homicídio teve sua sentença definida também em 2024, quando, em 31 de outubro, seus assassinos confessos foram condenados a mais de 70 anos de prisão. O crime político que chocou o país e teve grande repercussão internacional, tentou calar a socióloga e mestre em Administração Pública, Marielle Franco, que atuava como presidente da Comissão da Mulher na Câmara. Ela iniciou sua militância em direitos humanos após ingressar no pré-vestibular comunitário e perder uma amiga, vítima de bala perdida, num tiroteio entre policiais e traficantes no Complexo da Maré, onde nasceu e cresceu. A vereadora se apresentava como "mulher, negra, mãe e cria da favela da Maré".
#ParaTodosVerem Montagem com várias fotos de pessoas negras, à frente delas há um contorno do Brasil em branco, com o trecho do samba-enredo “História para Ninar Gente Grande”:
Com versos que o livro apagou
Desde 1500
Tem mais invasão do que descobrimento
Tem sangue retinto pisado
Atrás do herói emoldurado
Mulheres, tamoios, mulatos
Eu quero um país que não está no retrato
Brasil, o teu nome é Dandara
E a tua cara é de cariri
Não veio do céu
Nem das mãos de Isabel
A liberdade é um dragão no mar de Aracati
Salve os caboclos de julho
Quem foi de aço nos anos de chumbo
Brasil, chegou a vez
De ouvir as Marias, Mahins, Marielles, malês